Ensino de Ciências e Biologia para pessoas com deficiência visual

questões e desafios para a docência durante a pandemia de COVID-19

Palavras-chave: Educação em Ciências, Narrativa, Deficiência visual, Currículo, Trabalho docente

Resumo

O objetivo deste artigo é analisar a experiência, no cenário pandêmico, de uma professora de Ciências e Biologia que leciona em uma instituição pública especializada na educação de pessoas com deficiência visual localizada no município de Belo Horizonte, Minas Gerais - Brasil. Discutem-se, aqui, processos de formação profissional e de didatização de conceitos científicos antes, durante e após o ensino remoto emergencial. Considera-se que a pandemia de COVID-19 e as problemáticas associadas ou acentuadas por ela trouxeram desdobramentos críticos para os processos educativos, com impactos ainda mais severos e complexos para populações de estudantes que carregam marcas da exclusão social em seus corpos e em suas trajetórias educativas, dentre as quais se encontram alunos e alunas com deficiência visual. Alicerçada por uma matriz teórico-metodológica que relaciona as pesquisas (auto)biográficas aos estudos do campo do Currículo, a narrativa da professora, produzida por meio de uma entrevista, é triangulada e contrastada com as prescrições feitas pelas políticas educacionais mineiras presentes em documentos oficiais. Assim, evidenciam-se atravessamentos do currículo por dispositivos de controle e regulação que foram catalisados durante o período de ensino remoto emergencial, bem como a resistência docente e a luta pela acessibilidade no ensino de Ciências e Biologia diante de um panorama precário para a inclusão. A análise da narrativa da professora contribui para que compreendamos como desafios históricos ao trabalho pedagógico com estudantes cegos ou com baixa visão foram aprofundados no “chão da escola” em tempos pandêmicos. Foram apontadas limitações colocadas pelo uso compulsório de tecnologias digitais de informação e comunicação que não atendem às demandas específicas do referido público e questões atreladas ao tratamento homogeneizador e uniformizante conferido pelas políticas curriculares, que ignoraram as particularidades de quem requer atendimentos educacionais especializados. Conclui-se que a autonomia pedagógica é um pressuposto incontornável para a elaboração de abordagens didáticas que sejam capazes de pôr realidades e especificidades dos discentes com deficiência visual em diálogo com os conhecimentos científicos.

Biografias dos Autores

Evani Batista Gomes, Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) – Ibirité, MG, Brasil

Graduanda em Ciências Biológicas pela UEMG

Thalissa Gabriele Teixeira Lopes, Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) – Ibirité, MG, Brasil

Graduanda em Ciências Biológicas pela UEMG

Rodrigo Cerqueira do Nascimento Borba, Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) – Ibirité, MG, Brasil

Doutor em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF)

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Publicado
2023-01-27